terça-feira, 9 de setembro de 2008

Construções, tácticas, sistemas, jogadores, contratações e ambições. A visão do prof., em entrevista ao Público de hoje:

"FC Porto não está mais fraco, está é diferente e em construção"

No primeiro balanço ao título ganho na época passada, Jesualdo Ferreira fala do FC Porto para 2008-09. E da saída de Quaresma.

Na sua primeira entrevista em mais de um ano, Jesualdo Ferreira explica como levou o FC Porto ao título. E o que vai mudar esta época.

Escreveu-se que Quaresma queria sair, mas que o FC Porto também desejava vendê-lo. Ficou aliviado com a partida do jogador para Milão?
O tema Quaresma resume-se a uma questão de mercado. Toda a gente sabe qual foi o seu passado antes de chegar ao FC Porto. Foram a equipa e o clube que conseguiram retirá--lo da situação pouco satisfatória que se seguiu à passagem pelo Barcelona. O Quaresma teve quatro anos diferentes no FC Porto. No primeiro, as coisas não lhe correram bem, em resultado do que se tinha passado na época anterior. No segundo ano foi-se afirmando e, nos dois seguintes, conquistou o mercado. A aspiração do jogador em sair, manifestada publicamente, poderá ter feito alguns pensarem que era o próprio clube que queria que ele saísse. Mas a verdade é que o Quaresma não queria ficar. A partir daí, não estavam criadas as condições mínimas para ele ficar, sob o ponto de vista da disponibilidade e empenhamento...

Lucho chegou a dizer que queria sair e agora é a principal imagem de marca do clube...
Não há dois jogadores iguais. Quem conhece o Quaresma (e eu conheço-o um bocadinho) sabe que, quando ele falou publicamente, era aquilo que ele sentia e que jamais voltaria atrás. Muitas vezes, a forma como se dizem as coisas e como são manifestadas fazem com que um grupo de trabalho como o do FC Porto tenha um comportamento de acordo com o que é mais importante para a salvaguarda do bem-estar do todo da equipa. A partir do momento que se sentiu que o Quaresma queria sair, ficou evidente que se podiam criar as condições boas para que saísse e para que o FC Porto fosse convenientemente recompensado.

E essas condições boas verificaram-se?
Ouça, eu não me recordo de o FC Porto ter feito até hoje um mau negócio. O que eu sinto é que este negócio foi o que tinha de ser feito. Até porque o volume de dinheiro de que se fala vai seguramente ser aumentado.

Mas não chegou a ter problemas com Quaresma?
Nunca houve problemas entre o Jesualdo e o Quaresma. O que houve, durante dois anos, foi um trabalho conjunto entre um jogador e um grupo de jogadores e uma equipa técnica, em que as questões surgem sempre, naturalmente, mas em que, acima de tudo, se pôs sempre à frente de tudo o rendimento da equipa e os objectivos. E, agora, o que eu desejo fundamentalmente ao Quaresma é a melhor sorte do mundo.

Tacticamente, há um antes e um depois de Quaresma?
Nada disso. Durante os dois anos em que estive aqui no FC Porto, falou-se sempre que o FC Porto deveria jogar num determinado sistema e que não o faria por causa do Quaresma. Quero dizer às pessoas que quem define os sistemas de jogo do FC Porto é o seu treinador. Já antes de eu estar no FC Porto se jogava em 4x4x3. A questão aqui não tem a ver com o Quaresma, tem a ver com determinados conceitos que os treinadores têm.

Ficou satisfeito por o Pelé ter sido incluído no negócio?
Na minha opinião, ao integrar esse negócio, o Pelé revelou-se uma mais-valia para o FC Porto.

Com as saídas de Quaresma, Assunção e Bosingwa, o FC Porto não ficou mais fraco?
Desde que entrei no FC Porto, saíram cinco jogadores da equipa--base: Pepe, Anderson, Bosingwa, Paulo Assunção e Quaresma. O volume de negócios que esses jogadores proporcionaram foi significativo. O mercado do futebol tem vindo a valorizar o trabalho que o FC Porto faz. Mas, à medida que saíram, o FC Porto foi-se preparando para ter um novo rosto. Isso significa que falar em ser mais fraco ou menos forte é irrelevante. O que se pode dizer é que o FC Porto é diferente. Tal como aconteceu quando foi campeão europeu. Aliás, nos anos que se seguiram a 2004 saíram seis ou sete jogadores da equipa-base. Esta remodelação é normal no futebol actual.

O FC Porto não teve instinto matador frente ao Benfica...
Isso era conversa para umas horas... Na Luz, o FC Porto foi uma equipa que ninguém esperava, na formação, atitude e comportamento táctico. Foi uma equipa compacta, agressiva e que queria ganhar o jogo - e sabia como o podia ganhar. À medida que o jogo foi correndo, percebeu-se que o FC Porto tinha argumentos para ganhar. Chegou ao intervalo a ganhar, teve oportunidade de fazer o segundo golo e acabar com o jogo, acabou por sofrer um golo num lance pouco esperado e, logo de seguida, com a expulsão do Katsouranis, passámos a ter outro jogo.

Qual foi a diferença entre um jogo e o outro?
O primeiro, com cerca de 60 minutos, foi partido, dividido. A intensidade mostra-se na ocupação dos espaços, nos metros que se consegue ganhar ao adversário, nas disputas individuais, nos lances de perigo que se criam, na forma como se anula o adversário. A partir de certa altura, essa intensidade foi de tal maneira favorável ao FC Porto que acabaram os espaços e começou o tal segundo jogo. O resultado dessa superioridade manifestou-se depois nos 20 a 25 minutos finais, com as maiores dificuldades do Benfica. Como tinham acabado os espaços, baixou a intensidade, porque ninguém joga contra um muro para ser rápido. Como passou a haver um outro jogo, houve a necessidade de nos adaptarmos tacticamente. Isto é: jogar num espaço mais reduzido, com uma barreira de oito ou nove jogadores à frente da baliza, jogar com o adversário a quebrar o ritmo constantemente. Houve ainda necessidade de introduzir novos jogadores. Quem está de fora e percebe pouco analisa a situação sem levar tudo isto em conta.

Mas porque é que o FC Porto não conseguiu marcar?
Porque com menos espaço é mais difícil criar oportunidades. O jogo torna-se menos intenso, os erros cometem-se com mais frequência, porque a ansiedade não existia só do lado do Benfica. Os comportamentos tácticos foram naquela altura alterados. E ainda não há por parte dos nossos novos jogadores o conhecimento prático da vivência dessas situações. Isto já aconteceu a todas as equipas do mundo.

Porque arriscou lançar Rolando, Fernando, Tomás Costa e relançar Fucile na esquerda?
Porque do estudo que fizemos ao adversário e ao plantel do FC Porto resultou que aquela era a melhor equipa para defrontar o Benfica.

Só o Benfica?
Pelo menos com o Benfica.

O 4x4x2 foi para obter superioridade no meio-campo ou receio do novo Benfica?
Que fique claro: o FC Porto nunca vai abdicar da sua individualidade e estrutura. Mais: não forma as suas equipas nem joga nenhum encontro no sentido de anular o adversário para poder jogar. O FC Porto entende que, para anular o adversário, tem de jogar. Nesse contexto, a colocação de algumas unidades em campo obedeceu a uma preocupação: não perder a identidade, o sistema e a estrutura.

O Tomás Costa foi médio-direito com a intenção de não deixar subir o Leo?
Não. Ele fez na direita aquilo que o Rodriguez fez na esquerda. O ala só baixa se o lateral subir, não é? O Tomás era o único, com excepção do Candeias (muito novo e vindo de uma paragem), que poderia jogar mais próximo da linha. Se o Mariano estivesse disponível, jogaria o Mariano, podendo o Tomás até jogar noutra posição. Se o FC Porto tivesse jogado com o Mariano, essa questão já não se colocaria. São análises incorrectas.

Os reforços utilizados garantiram um lugar na equipa?
O FC Porto passa cada vez mais a ter um leque de jogadores capaz de jogar em qualquer momento. Há muitas provas, a densidade competitiva vai ser grande e entendo que, ao contrário da época passada, o FC Porto tem de construir uma equipa. Na época passada entrámos nas competições com uma equipa feita, rotinada, com entendimento claro entre os jogadores e entre estes e o treinador. Não havia muito mais a fazer do que melhorar os comportamentos tácticos. Este ano, o FC Porto está a construir uma equipa e isso não nos garante, por enquanto, a constância da época passada. É importante as pessoas perceberem esta realidade e que não há como fugir a ela. Vamos admitir que este é um FC Porto em construção e trabalhar para discutir aquele que é o nosso grande objectivo, que é voltarmos a ser campeões.



"O Tomás Costa pode vir a ser um jogador de top"

Queria um plantel mais forte fisicamente. Conseguiu-o?
Acho que sim. Este grupo é mais forte e mais agressivo.

Na época passada nenhum reforço se impôs. Este ano há sinais diferentes...
São diferentes porque, na época passada, a equipa estava formada.

Não terão estes mais qualidade?
Alguns têm mais qualidade e há outros iguais. A diferença está no facto de esta ser uma equipa em construção. A do ano passado não necessitou, para fazer o seu trajecto, de Marianos, Stepanoves e Bolattis, que só foram importantes a partir de certa altura, após o processo de integração.

Recomendou todos os reforços?
Claro que avalizei as contratações. O scouting do FC Porto fez o seu trabalho, houve um momento em que reunimos as informações e estabelecemos as necessidades. Foram jogadores que eu quis.

Pode falar-nos sobre cada um?
O Sapunaru é robusto, defende bem, no jogo aéreo e não só. Está a adaptar-se. É novo e a única coisa que não precisa é que o comparem ao Bosingwa.

O Rolando fez 23 anos e toda a gente o conhece do Belenenses. É um excelente jogador.

O Guarín tem 22 anos, é titular da Colômbia e tem alguma cultura europeia. Tem condições para vir a ser um grande jogador.

O Tomás Costa é aquilo a que chamo de superactivo. Só tem 23 anos, mas tem uma capacidade tremenda de participar no jogo colectivo. Tem de aprender as questões práticas do futebol europeu. Pode vir a ser um jogador de top no FC Porto.

Na posição 8 e não na 6...
Tem pouca disciplina táctica. Ele próprio não sabe bem quais vão ser as suas funções no futuro. Ele, o treinador e os jogos é que o irão dizer.

Com Rodríguez haverá mais agressividade e menos magia?
O Rodriguez veio para o Benfica do PSG, não veio directamente do Uruguai. Tem 22 anos, ainda tem uma margem de progressão grande. Está a adaptar-se para evidenciar as grandes capacidades que possui.

Como descobriram um brasileiro na II Divisão japonesa?
O Hulk tem grande capacidade física e pormenores técnicos importantes para a posição. Vai ser sujeito a um trabalho sereno para poder tirar mais rendimento das suas capacidades. Mas quem faz golos de fora da área no Japão (como ele já fez com o Belenenses), fá-lo em qualquer lugar do mundo.
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O Fernando fez um ano na Europa, deu boas indicações e o processo para ele está facilitado. O Benítez é um lateral tipicamente argentino. Tem raça e é um jogador de equipa. Tem de trabalhar tacticamente.

Ele tem sido o que menos convenceu a crítica...
Duvidaram dele mal chegou...

Não era titular no Lanús...
Jogou o tempo suficiente para ser campeão da Argentina. Provavelmente o Lanús tinha dois jogadores para aquela posição. O FC Porto, quando contrata um jogador deste tipo, procura avaliar as suas potencialidades no futuro.

Já se percebeu que gosta de Candeias, formado no clube...
Tem muitas capacidades. Dei-lhe modelos de treino e de jogador. E que se resumem a isto: é superactivo, tem boa capacidade física, coragem e é agressivo a atacar. Mas tem de integrar as suas capacidades no jogo colectivo. De outra forma será sempre uma eterna esperança.

Vai jogar mais vezes em 4x4x2?
É mais ofensivo o 4x3x3, com três avançados, ou o 4x4x2, com dois?
Depende dos jogadores em causa e das dinâmicas.
Pois, e a questão foi sempre essa. Mas até parece que o 4x4x2 é muito mais ofensivo. O FC Porto tem o seu sistema base. E depois tem princípios, métodos e estratégias, que variam. O sistema não define o modelo. O modelo é um conjunto de sistemas, princípios, métodos e estratégias. O que se pretende atingir cada vez com maior eficácia é que é o modelo. Portanto, o sistema do Porto é o 4x3x3, a sua dinâmica nunca indicia o 4x3x3 permanente, os princípios que o Porto tem sob o ponto de vista do seu método, quer seja a zona ou o aproveitamento dos espaços, faz-se com transições rápidas, a definição das áreas de pressão, a capacidade de ritmar o jogo, que já foi mais forte na época passada. Tudo isto faz parte dos processos que o FC Porto utiliza para chegar ao modelo. O problema é que as pessoas confundem o modelo com as tácticas e com o sistema.

Mas vai jogar esta época mais vezes em 4x4x2...
O FC Porto, na época passada, já jogou tantas vezes em 4x4x2... Agora, para algumas pessoas, o
4x4x2 é uma equipa com quatro defesas, quatro médios e dois avançados. Cada vez que o treinador do FC Porto mexe uma unidade que pode ser uma indicação de que vai jogar em 4x4x2, o que se diz é que o treinador do FC Porto está a inventar. Muitas vezes, quem está a analisar estas questões não está a ser sério. Ou então não sabe.

3 comentários:

Fanático disse...

O JF pareceu-me um bocadinho amargo; não respondeu à questão Luxo e também acho que o Tomy e o Candeias vão explodir esta época!!

Quanto ao RQ, confirma-se o que pensava: queria mesmo sair e não havia forma de o motivar se não saísse.

Não percebi a questão do sistema e o modelo; fui só eu? ou o JF também ainda não percebeu...

Fanático disse...

Muito interessante este comentário do Dragão atento no blogue do Vila Pouca:

À atenção de Jesualdo Ferreira. (resultado da observação do Sapunaru no jogo Roménia x Lituânia 0 – 3, Eurosport)

Até um leigo vê que o Sapunaru é um defesa central adaptado (pelos romenos) a "defesa lateral". É evidente que não tem características de defesa lateral "nato",ou seja, joga bem de cabeça, talvez até seja capaz de cruzar bem, mas não é um "sprinter". E quem tenha de jogar nas alas tem de ser rápido, ter velocidade de pernas, além da sempre indispensável técnica para jogar futebol.
Por isso prevejo que o Sapunaru para vencer na equipa do FC Porto, vai ter de trabalhar muito os seus aspectos menos positivos (corrida, mudanças bruscas de velocidade, sprints). Mesmo admitindo que sim, não sabemos se um dia conseguirá chegar a atingir o nível suficiente de modo a convencer os adeptos do FC Porto.

Fanático disse...

Enquantos os palhaços dos ensanguentados se preocupam com as jogadas de secretaria - as únicas que sabem fazer - os nossos jogadores brilham nas selecções

1)No rescaldo do empate com o Paraguai, no último sábado, Lisandro assumiu o destaque nos trabalhos da selecção argentina. O avançado do FC Porto marcou três golos à equipa de Sub-20;

2) Guarín salvo das críticas e com titularidade garantida
2008-09-09
O médio Guarín foi um dos poucos jogadores da Colômbia que mereceram elogios nos meios de Comunicação Social daquele país, depois da derrota com o Uruguai, por 1-0, a contar para a fase de qualificação do Campeonato do Mundo da África do Sul. "Poucos jogadores se salvaram na exibição frente ao Uruguai. Um deles foi Guarín", escreveu o jornal "El Colombiano